"Há um elo entre ingerir e ser" — afirma Latifa Laâbissi. Ela — a boca — continua a abrir-se. "O futuro do cosmos é a devoração" (ibid.). Uma grande boca que se abre para devorar, que é casa do grito coletivo que se projeta sem som, só ar. "O antropofagismo não é senão a expressão de um respeito metafísico pelo outro; mais do que absorver, é deixar-se capturar, aceitar o convite do outro no meu próprio corpo" (ainda Latifa). Nesta abertura, reside a obsessão, um lugar onde caber. E mais, um lugar para Ser, onde ar é alimento e matéria de conexão. Esta figura da abertura — onde a relação esquecida com o ar (leia-se, com o Ser) poderá ser, talvez, recuperada ou redescoberta — dá contorno à pergunta do filósofo. O contorno de uma abertura "cada vez mais aberta", onde o ar é, antes de mais, "matéria fluida transportada pelo sangue que ela dá [e que, por isso], pode também ser entendido como voz e fenómeno" (Irigaray).
"[A] boca é, ao mesmo tempo, lugar e não lugar: é o locus de uma des-locação, o lugar lacunar da ‹‹quasi permixtio›› entre a alma e o corpo, isto é, a extensão incomensurável entre eles e comum a ambos, uma vez que a boca, antes da oralidade — abre uma abertura, espaça-se, ‹‹abre(-se)›› e ‹‹distende(-se)›› (...)" (Derrida, On Touching)
E o que dizer das mãos? Também elas podem dar forma aberta, ou ser recipiente. E ainda, junto à boca, em torno dela, prolongar o grito.